domingo, 24 de agosto de 2008

Esquema do texto 1: Chalhoub

CHALHOUB,Sidney

[1996b] "Medo branco de almas negras: escravos, libertos e republicanos na cidade do Rio de Janeiro" In: Discursos Sediciosos,Ano I, no. 1: 169-189.

Esquema do texto

  1. Autor
  2. Obra
  3. Estrutura do texto
  4. Objetivo do texto
  5. Palavras-chave
  6. Métodos
  7. Fontes utilizadas
  8. Conclusões do texto
  9. Questões e críticas

1. Autor: Sidney Chalhoub (1957-), nascido no Rio de Janeiro (graduação na UFRJ- Lawrence University, mestre pela UFF e doutor pela UNICAMP), prof. do Depto. História da UNICAMP desde 1985.

Principais obras:

- Trabalho, lar e botequim: o cotidiano dos trabalhadores no Rio de Janeiro da Belle Époque (Brasiliense, 1986) - mestrado

- Visões da Liberdade: uma história das últimas décadas da escravidão na Corte. (Companhia das Letras, 1990) - doutorado

- Cidade Febril: cortiços e epidemias na corte imperial. (Companhia das Letras, 1996)

- Organizou juntamente com Leonardo Affonso de Miranda Pereira A História Contada: Capítulos de História Social da Literatura no Brasil. (Nova Fronteira: 1998), em que contribui com um capítulo intitulado “Diálogos Políticos em Machado de Assis”

- Machado de Assis: historiador. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.

O autor trabalhou sobretudo com a 2ª. metade do século XIX e primeiras décadas do século XX no Rio de Janeiro, tendo a escravidão e as classes populares como temas centrais em um enfoque de história cultural marcado pelo diálogo com a antropologia (Geertz). Trabalha, sobretudo, nas duas primeiras obras, com processos judiciais criminais, tendo recentemente analisado obras literárias (Machado de Assis).

2. Obra:

- Trata-se de um artigo publicado em uma revista de criminologia de esquerda, mas o artigo baseia-se na pesquisa que redundou no seu segundo livro: Visões da Liberdade.

3. Estrutura do texto

  1. Morte aos republicanos (169-172)

- Rui Barbosa acusa a monarquia de insuflar os libertos contra os republicanos

- Desde a Revolta do Vintém, em 1880, que se percebera a importância de mobilizar o povo da capital, o que foi feito pelos abolicionistas na déc. 1880

- Rui tinha medo da mobilização dos negros, vistos como despreparados para a vida em sociedade (“vítimas da escravidão”, “libertos inconscientes”) e frustrava-se com a popularidade do Imperador após o 13 de maio

- É preciso ter em mente esta oposição popular aos republicanos para entender o que ocorreria depois da proclamação: a perseguição a capoeiras, bicheiros, cortiços etc; bem como seria importante levar em conta esta impopularidade da república para entender a Revolta da Vacina em 1904

- Provas da popularidade do imperador: passagem de J.Nabuco, D. Obá II, 5 passagens de João do Rio (tatuagens monarquistas dos negros, nome dos cordões de carnaval)

- O mais importante: Os negros haviam “instituído uma cidade própria” contra a qual a República se voltou, esta cidade tinha uma dinâmica própria, solapadora da escravidão, arredia e altiva

  1. O teatro dos vícios (172-184)

- 1857: a proposta de enviar dezenas de africanos livres (que estavam depositados na Casa de Correção) para o Espírito Santo, para afastá-los do “teatro dos seus vícios”, ou seja: a cidade do Rio de Janeiro, vista como cidade negra perigosa e imprevisível, onde podiam estar se tramando conspirações interprovinciais e até internacionais

- Em 1835 o Natal fora marcado pelo medo de uma revolta de escravos das províncias do Rio de Janeiro e de Minas Gerais (que não passou de um susto, mas sem dúvida era um reflexo da revolta dos malês em Salvador alguns meses antes)

- O fantasma do Haiti (1805) sempre presente em uma cidade em que cerca de metada da população era constituída por escravos e libertos na primeira metade do século XIX [recomendar Karasch]

- Os negros lutavam para permanecer neste “teatro urbano privilegiado”, como os que planejaram o assassinato do seu senhor porque ele iria vendê-los (provavelmente) para uma fazenda de café

- Na argumentação do senhor (que tenta absolver suas “mercadorias”), ele tenta negar (estrategicamente) o saber dos negros “o embrutecimento dos seus espíritos e falta absoluta de educação”

- É preciso observar que este saber escravo existia, como se depreende da argumentação do escravo Cyriaco que queria permanecer na cidade, mencionando a sua circulação pela cidade

A cidade esconderijo (175-179)

- Batalhas entre a cidade codificada e desejada pelos brancos x cidade instituída pelos negros (cidade esconderijo)

- Bráulio, 20 anos, que foge da fazenda em Valença e adota na Corte o nome de Braz e a diz-se preto livre, mas acaba na Casa de Detenção, talvez traído pelas cicatrizes nos calcanhares devido aos castigos no tronco

- O meio urbano escondia a condição social dos negros, misturando as identidades de pretos e pardos, escravos ou livres, trabalhadores cativos ou assalariados, amparados em uma ampla rede de relações sociais mas levava à construção de uma suspeição generalizada contra os negros [aqui pode entrar Batuque na Cozinha, apostila p.69, texto 27]

- Antes de adotar a tática da suspeição generalizada, os administradores da cidade tentaram evitar a transformação da cidade em esconderijo através de proibições: Código de Posturas de 1830 proibia pessoas cativas sentadas à porta de casas de negócio; o de 1838 recomenda aos donos de tavernas que não permitam o ajuntamento de mais de 4 escravos e estabelece que os escravos encontrados das 19h em diante sem carta do seu senhor (datada daquele dia), seriam presos por oito dias

- Consequências dessa movimentação negra: destruir vagarosamente a cidade branca ordenada, mas (p.179): “Ao mesmo tempo, o medo branco dessas almas negras já tentava engendrar a cidade armadilha da suspeição generalizada”

A cidade solidária (179-184)

- “a cidade negra era também solidária. Ela era capaz de buscar e tecer solidariedades de formas diferentes e com objetivos dos mais variados.”

- Pequenos furtos, movidos pela necessidade (latas de goiabada, roupas, galinhas) e que eram vendidos por comerciantes brancos

- Medidas dos administradores contra a cidade solidária: Código de Posturas de 1830 multa e prisão para quem tivesse casa de negócios que comprasse bens que se julguem furtados; o de 1838 proibia os belchiores (lojas de bens e roupas usadas) sem assinar termo de não comprar coisa alguma a escravos ou a pessoas suspeitas (uma nova e ampla categoria).

- Os administradores demonstravam estar preocupados com seus bens e esta paranóia branca da propriedade é ironizada no famoso lundu do Pai João [Apostila, p. 12, texto 008]

- O fantasma baiano (1835) è moderação dos castigos: Código de Posturas de 1838 pedia aos fiscais que vigiassem “o mau tratamento e crueldades que se costumam praticar com escravos”, possivelmente para evitar o levante em massa; ex. Vizinhos incriminam casal que havia morto a “neguinha” Margarida

- O medo branco parece ter aumentado após 1870 quando mostra-se que a classe dominante não tolerava mais senhores que supliciavam seus escravos (ex. Escrava Francelina que em 1872 é absolvida por 5x3 da acusação de assassinar sua cruel senhora por envenenamento – este caso mostra haver uma rede de solidariedade: um fiscal da freguesia amigo de Margarida teria comprado o veneno, um plano envolvendo homens livres, um pardo e talvez até sua ex-proprietária)

- Além dessa solidariedade vertical, havia também uma rede horizontal bem mais apertada entre os escravos e negros livres (amante que consegue dinheiro para alforriar parceiro ainda cativo, africanos que se unem para denunciar gatuno, grupos de batuque e dança, manifestações religiosas).

  1. Os vagabundos do governo (184-187)

- Celso Furtado: um preconceito contra os libertos muito próximo da visão dos proprietários de escravos do século XIX: sem hábitos de vida familiar, sem se preocupar em acumular bens, retardado mental e com tendência para o ócio; os negros aparecem aqui como obstáculos ao nosso desenvolvimento, desajustados em estado de patologia social.

- O medo que políticos imperiais e republicanos tinham do liberto

- O medo como uma dimensão oculta da história (ele é sempre negado, recorrendo-se a argumentos lógicos elaborados para combater o que se teme) tão válida para elucidar momentos ou períodos históricos quanto (p.185) “o estudo da acumulação de capital, ou a análise das mudanças nos processos de produção”

- Os republicanos tiveram um medo profundo da cidade negra, da cidade diferente

- O medo branco da cidade negra parece ter aumentado com o fim da escravidão e da monarquia, levando à intolerância e truculência dos republicanos frente à cidade negra, movidos pelo medo, em nome do progresso e da ordem, da higiene, da moral, dos bons costumes, da civilização

- Numa briga de quitandeiras, as duas pretas, uma delas chama a outra de branca (sinônimo de frouxo) e Luiz Edmundo atesta o desafio (com pronúncia negra) aos guardas civis:

‘Eu vou bebê,

Eu vou me embriagá,

Eu vou fazê baruio,

Prá poliça me pegá.

A puliça não qué

Que eu dance aqui,

Eu danço aqui,

Danço acolá’

- Augusto, pardo de 35 anos, foi assassinado por um guarda civil (as diferenças precisam ser eliminadas) em 1909 ao provocá-lo dizendo que o governo não tinha dinheiro mas pagava vagabundos pra ficarem em pé nas esquinas.

- Medidas republicanas como perseguir capoeiras, demolir cortiços, reprimir a vadiagem eram “golpes deliberados contra a cidade negra”

- Esta (p.189) “luta entre modos diferentes de viver deu-se nas ruas” e “A revolta da Vacina em 1904 pode ter sido o último grito de protesto da cidade negra clássica”

4. Objetivo do texto:

p.171: “o objetivo desse pequeno artigo é investigar especificamente os significados possíveis do aparente antagonismo entre a população negra da cidade do Rio de Janeiro e os governantes e burocratas republicanos. O interesse aqui é mostrar que havia um sentido cultural profundo na hostilidade dos negros a algumas medidas da administração republicana. Na verdade, talvez seja possível sugerir que um dos sentidos da proclamação da República foi ten-

p.172: tar por um dique e anular, ou pelo menos disciplinar, a influência cada vez mais decisiva que as agitações nas ruas da Corte estavam a desempenhar nos rumos que tomavam os conflitos no interior da classe dominante.”

5. Palavras-chave (ou expressões)

- medo

- cidade negra

- suspeição generalizada

- sentido cultural

6. Métodos

- Hermenêutico ou interpretativo (no sentido da antropologia de Geertz): análise do significado político e social de histórias de vida entrevistas em processos criminais

7. Fontes utilizadas:

- Sobretudo processos criminais

- Correspondência policial

- Documentação do Ministério da Justiça

- Códigos de Posturas da Câmara Municipal

- Periódicos

- Fontes literárias

8. Conclusões:

i. O medo como dimensão oculta da história

ii. O medo dos negros como um móvel das ações republicanas

iii. A resistência da cidade negra x cidade branca ordenada, levando à suspeição generalizada

9. Questões e críticas:

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